Seguros justos, Saúde segura

A saturação do mercado de trabalho em profissionais de medicina dentária permitiu a proliferação de seguros e planos de saúde com diminuição progressiva dos valores cobrados pelos actos médicos, até ao ponto de se venderem produtos com a oferta de tratamentos dentários gratuitos.

A economia de escala trouxe inevitavelmente a mercantilização da Saúde, e hoje é utópico considerar uma sociedade em que os seguros e planos de saúde não tenham lugar. Contudo, a área da Saúde não pode ser equiparada ao comércio de serviços e produtos. A Saúde, a par da liberdade, é o bem mais precioso do ser humano. Sendo um bem, é passível de ser transaccionado, e a comercialização agressiva deste bem que temos assistido levanta inúmeras questões éticas e morais, com consequências negativas graves para o paciente.

Por isso, urge combater a desvalorização dos actos médicos, regulamentar eficazmente a publicidade e as boas práticas, criar guidelines que permitam auferir os custos operacionais e remuneratórios dos actos médicos, tendo em consideração as diversas variáveis que lhe estão associadas, e sensibilizar os utentes para não compactuarem com determinadas situações contratuais.

Existem empresas, conglomerados e grandes grupos económicos que, com os investidores certos e uma rápida implementação no mercado, se sentem no direito de propor condições contratuais e de trabalho desumanas aos médicos dentistas. Numa sociedade individualista e num mundo mercantilista, haverá sempre quem esteja disposto a aceitar essas condições, com prejuízo de quem efectivamente trabalha, porque quem as propõe só pensa em como rentabilizar o seu negócio. Não nos podemos esquecer da percentagem cada vez maior de colegas que enfrentam situações precárias, seja de trabalho ou de sobrevivência, e que procuraram outras saídas profissionais fora da Medicina Dentária.

Em última instância, é importante perceber que o principal prejudicado por esta saúde que se vende ao quilo é o paciente, e se a sociedade não se parece minimamente preocupada com a mercantilização da saúde, terá uma surpresa desagradável em breve. A prestação de cuidados de saúde deu lugar à venda de produtos de saúde, de forma tão leviana e banal como quem vai ao supermercado, o que acarreta inúmeros dilemas éticos e consequências graves para as pessoas.  

Uma seguradora será naturalmente um negócio, a própria Saúde é um negócio. Uma seguradora que entenda que o seu segurado terá maior satisfação por ter valores gratuitos e abaixo de custo nos actos médicos, ao invés de uma relação de confiança e liberdade de escolha dos profissionais de saúde, assume uma visão supérflua e limitada da Medicina, não considerando as demais variáveis que podem influenciar negativamente o bem-estar do paciente: a sobrefacturação, o sobretratamento, a publicidade agressiva para captação de clientes (e não pacientes), a diminuição da qualidade dos tratamentos, o subemprego  

Na esperança de se poder perspectivar um diferente prisma no modelo de implementação no mercado das seguradoras e subsistemas de saúde, garantindo um efectivo apoio ao doente e uma relação transparente e fidedigna com os prestadores de saúde, tecemos os seguintes tópicos:  

 

O que está mal:

- Tratamentos gratuitos e abaixo de custo

- Publicidade prejudicial à dignidade da Medicina Dentária

- Representação clínica nos conselhos consultivos

- Incumprimento do Código Deontológico da OMD, designadamente no que diz respeito ao Artigo 39º

- Tabelas de actos médicos não homologadas à tabela de nomenclatura da OMD  

 

Propostas:

- Transpor para a Lei Geral uma homologação do Número 1 do Artigo 39º do Código Deontológico da OMD: « A medicina dentária é por natureza uma atividade com custos inerentes, pelos quais é devida contraprestação pecuniária fixada livremente, não podendo ser praticados atos profissionais gratuitos de forma generalizada ou regular »

- Proibição da promoção, contratualização e divulgação de actos médicos gratuitos, com a despromoção tendencial e progressiva de valores abaixo de custo

- Vinculação legal obrigatória das seguradoras, subsistemas e planos de saúde à tabela de nomenclatura da OMD

- Permitir ao doente a escolha do regime comparticipativo dos actos médicos, sem agravante na contratualização do seguro de saúde

- Permitir ao doente a livre escolha do prestador de saúde, remetendo para segundo plano a contratualização do prestador com a seguradora

- Regulação firme da publicidade em saúde, com a proibição da divulgação e promoção de valores de actos médicos

- Implementação de médicos dentistas independentes nos conselhos consultivos das seguradoras, subsistemas e planos de saúde, com autonomia para elaborar pareceres, convocar reuniões dos mesmos e participar nas reuniões dos conselhos directivo e consultivo

- Colaboração das várias entidades na elaboração de uma tabela de custos operacionais e logísticos para as diversas subespecialidades da Medicina Dentária, atendendo às diversas variáveis envolvidas

- Criação de guidelines de boas práticas em Saúde, procurando o combate à sobrefacturação e ao sobretratamento


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